o livro pavões misteriosos – 1974-1983: a explosão da música pop no brasil, de andré barcinski (três estrelas, 2014), é uma sucessão de boas histórias, mas nem todas otimistas ou de sucesso.
como resume o autor, a partir ‘dos anos 1970, (...) nossa música jovem se libertou dos clichês da jovem guarda e criou uma sonoridade própria que não se limitava a copiar as músicas americana e italiana, até o momento imediatamente anterior à explosão do rock brasileiro, ocorrida na metade da década de 1980’.
o apanhado de 50 nomes da música pop brasileira apresenta-se como um guia musical para encher os ouvidos com sonoridades distintas, como odair josé, lady zu, ângela rô-rô e blitz – incluindo uma lista com um disco de cada grupo ou artista solo, para quem quiser conhecer ou para embalar a nostalgia e um período fértil e diversificado.
mas barcinski também a importância do trabalho dos produtores musicais, mercado que justamente se profissionalizou a partir deste período, o mercado musical/a indústria do disco (quando a música se tornou ‘comercial’, a partir de 1979) e faz reflexões sobre o uso do jabá (payola, ‘pagamento a djs, programadores ou donos de rádios pela execução de músicas’) e os ídolos ‘fabricados’ (como sidney magal, gretchen e as melindrosas e carlos imperial, entre outros).
dedica um capítulo, o brilho da cidade – está nevando no rio de janeiro, a um fenômeno que se alastrou no rio de janeiro a partir de 1982: a cocaína. naquele ano, arnaldo baptista, ex-líder dos mutantes, se jogou do terceiro andar do setor de psiquatria do hospital do servidor público, em são paulo, aos 33 anos; foi também o ano da morte de elis regina, aos 36 anos: ‘foi um choque para o país’, escreve barcinski. ‘até pouco tempo antes, elis era conhecida como avessa às drogas e chegou a criticar músicos e amigos q se drogavam. ‘elis se suicidou, foi isso q aconteceu’, diz (o empresário) andré midani.’
reserva outro para a discoteca, na nossa festa vale tudo, quando, em 1978, foi inaugurada a boate aquarius, que na noite de 14 de setembro, atraiu cerca de 8.700 pessoas – o proprietário estima em 10 mil, já que haviam ‘amigos e convidados que entraram pelas portas laterais’ –; vale lembrar que a discoteca tomou conta do mundo um ano antes, a partir do filme os embalos de sábado à noite, com john travolta, mas o gênero já existia desde o início da década e o primeiro artigo a citar a palavra disco, segundo barcinski, foi publicado em 1973 na revista rolling stones.
o brasil vivia um tempo ainda militarizado: o presidente emílio garrastazu médici sancionava a lei, que instituiu o código de processo civil brasileiro e o general ernesto geisel, presidente da petrobras, foi apresentado como candidato a presidente do país; é ano, também de uma tragédia aérea: o voo rg-820 da varig tenta um pouso forçado devido a fogo num toalete, cai em paris (frança) e deixa 122 mortos.
musicalmente falando, pode ser que muitos torçam o nariz para o pop, assim como muitos músicos foram patrulhados, pois os ouvintes da época – e a própria categoria, conforme depoimentos – pareciam identificar sucesso comercial com ‘entreguismo’. Nomes como o de robertinho do recife, fafá de belém e benito di paula, ficaram um longo tempo fora ‘da história oficial da música brasileira dos anos 1970’, conforme barcinski; ‘o pop é música do povo, e os músicos que tinham um pé no pop foram desbravadores’, comenta robertinho do recife, ‘pior mesmo foi a censura da mídia e do mercado, a censura das rádios, tvs e gravadoras, que era uma censura comandada e acabou com a carreira de muita gente’.
o livro encerra-se de forma melancólica, de acordo com a realidade da época (1983); entre algumas perguntas feitas por barcinski, ao chegar ao final do livro, chama a atenção uma delas: ‘é justo dizer que o trabalho destes artistas piorou nos anos 1980?’.
foi também em 1983 que Michael Jackson lançou o videoclipe de thriller – com 14min de duração, trata-se de um verdadeiro monumento audiovisual, segundo o autor do livro, que também diz representar uma ‘síntese da ganância, ambição e poder da indústria do disco’.
ainda naquele ano, plutão entrou em escorpião, segundo leiloca, ex-frenética: ‘plutão rege escorpião, e tem a ver com sexo e poder. foi a partir de então que as pessoas começaram a querer mais poder, mais poder, mais poder...’.
Dinarte Albuquerque Filho
Jornalista, poeta e professor
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